Ela foi a primeira pessoa a percorrer todo o Caminho da Mata Atlântica

Julieta Santamaria planejava uma cicloviagem pelo Brasil quando um amigo apresentou a ela o Caminho da Mata Atlântica. Durante a conversa, o rapaz jogou uma isca fundamental para fisgar a jovem de 25 anos: ninguém havia completado, até então, a trilha de 4.000 km que atravessa os estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Mapa do Caminho da Mata Atlãntica

Mapa do Caminho da Mata Atlântica

Em três dias, a argentina, morando em Ilhabela há cerca de 10 meses, mudou completamente os seus planos. Vendeu a bicicleta e outros pertences e começou a se preparar para a experiência mais transformadora da sua vida: “Senti o chamado no corpo, diferentemente da viagem de bicicleta que estava programando. Ao ver o projeto do Caminho da Mata Atlântica, fiquei encantada! Era uma oportunidade de conhecer muitas coisas novas e fazer, pela primeira vez, uma travessia sozinha, o que para mim era um desafio gigante.”

Durante seis meses, Julieta se preparou fisicamente, alternando caminhadas em trilhas longas – de 20 a 30 km em um dia, carregando uma mochila pesada nas costas – com corrida. A jovem não tinha conhecimento avançado sobre equipamentos e montanhismo, mas partiu assim mesmo rumo a uma jornada de 195 dias de caminhada, finalizada em junho de 2025.

“Fiz o planejamento sozinha, mas logo nos primeiros dias, eu passei um grande perrengue. Tentei atravessar o Parque Estadual do Desengano, no Campo de Goytacazes, quando vi que uma tempestade se aproximava. O caminho não estava muito bem demarcado e resolvi voltar. Na estrada, encontrei um pessoal do parque que me deu carona até a cidade de Santa Maria Madalena.”

Do perrengue ao planejamento estruturado

Julieta percebeu, então, que era necessário se planejar melhor, e contou com o apoio da equipe do Caminho da Mata Atlântica. “O Chico, coordenador geral do projeto, estava chegando na cidade e pediu para esperá-lo. Em conjunto, decidimos fazer planejamentos diários e semanais para ver como o meu corpo se adequaria. Foi um momento bom para eu refletir se realmente estava disposta a passar perrengues. Mas logo entendi que sim, e nunca mais parei!”

Julieta e Francisco Schnoor, do Caminho da Mata Atlântica

Julieta e Francisco Schnoor, do Caminho da Mata Atlântica

Ao longo do caminho, Julieta se surpreendeu com a resistência do próprio corpo, caminhando de 20 a 30 km por dia com a sua mochila. Apesar da ansiedade de chegar ao final, a previsão do tempo muitas vezes a fez sair da rota, o que enriqueceu ainda mais a sua experiência por meio da conexão com as comunidades locais. “Me senti acolhida o tempo todo. Fiz amigos em cada cantinho em que passei. Foi importante para entender a cultura e a história de cada povo, do que vivem, o que plantam. Passei por cinco estados distintos, entre mar e serra, e a vida é diferente em cada um deles.”

Entre os locais mais emblemáticos percorridos, Julieta destaca a Serra Catarinense, onde presenciou o céu se alternando entre o sol e a lua cheia. No último trecho, a jovem conta que percorreu cerca de 400 km acima de 1.000 m de altitude.

Canion Itaimbezinho, no Parque Nacional dos Aparados da Serra - Foto: Ana Momm

Julieta no Canion Itaimbezinho, no Parque Nacional dos Aparados da Serra – Foto: Ana Momm

O Conjunto Marumbi, no Paraná, também foi destacado pela beleza, história e pelo desafio de 12 horas de caminhada. “Além disso, a travessia Petrópolis-Teresópolis me marcou bastante por ter sido a minha primeira travessia na montanha.”

Julieta no Marumbi - Foto: Ana Momm

Julieta no Marumbi – Foto Ana Momm

Travessia Petrópolis x Teresópolis

A diversidade da fauna conquistou o coração de Julieta, que encontrou pelo caminho irara, macaco-prego, muriqui-do-sul, anta, queixada, javali, cachorro-do-mato, veado e diversas espécies de cobras.

Julieta em um encontro com os cachorros do mato

Cachorros do Mato

Cobra Coral

Preservação da Mata Atlântica

Durante todo o percurso, Julieta pôde observar diferentes cenários da Mata Atlântica, e agora faz um chamado consciente para a preservação dos ambientes naturais.

“Ao longo do caminho, conseguimos observar como as áreas mais preservadas e aquelas mais degradadas influenciam o clima, a temperatura e a quantidade de animais. É incrível saber que tantas espécies ainda resistem. Temos que focar na educação ambiental – ensinar as pessoas a viver em harmonia com a natureza. Sempre digo que a gente não cuida daquilo que não conhece. A preservação dos espaços naturais é uma forma de amor, porque, sem a natureza, não somos nada.”

Descoberta da solitude ao longo do Caminho da Mata Atlântica

Durante os 4.000 km percorridos, Julieta passou por uma transformação mental que a fez refletir sobre a sua existência. “Senti um filme da minha vida passando pela minha cabeça. Quando consegui me afastar dos meus pensamentos e silenciar a minha mente, me tornei mais consciente do que estava vivendo. Me senti mais presente. No nosso dia a dia, estamos acostumadas a pensar no passado e no futuro, mas hoje eu consigo habitar no agora. A experiência me fortaleceu bastante mentalmente.”

A jovem conta que fez diversas descobertas sobre si e passou a se perdoar mais. “Às vezes, somos muito cruéis com a gente mesmo. Comecei essa vivência com uma ideia vaga do que ela representaria, mas me conectei profundamente com a natureza. Hoje, estou buscando entender onde essa experiência vai me levar, porque não há mais volta. Descobri o que realmente quero: estar mais perto dos ambientes naturais.”

Inspiração para outras mulheres

Além da conquista pessoal, a coragem e a determinação de Julieta são fontes de inspiração para muitas outras mulheres. “Eu sinto muito orgulho por ter conseguido, porque ouvi muito que era perigoso uma mulher fazer o que eu estava fazendo. Mas durante todo o percurso, não passei por nenhuma situação de risco. Quando me sentia subestimada diante de alguns comentários, eu ria na cara das pessoas! Sentia um pouco de raiva, porque se fosse um homem, ninguém questionaria sua presença ali.”

Julieta e a placa comemorativa do Caminho da Mata Atlântica

Julieta Santamaria com a placa do Caminho da Mata Atlântica

Um exemplo do preconceito sentido por ela se deu por meio de uma reação diante de um pedido de informação, em Santa Catarina. “O homem colocou as mãos na cabeça e falou abismado: ‘Uma mulher sozinha fazendo isso? Não vai chegar do outro lado hoje!’. Eu já havia andado mais de 2.000 km! A gente tem que ocupar esse espaço que sempre foi nosso. Acho importante nos empoderarmos porque a sociedade já nos limita muito”, conta Julieta, que também foi inspirada por diversas mulheres que plantam e pescam sozinhas em suas comunidades.

Apesar do medo inicial de adentrar um mundo completamente desconhecido, Julieta não paralisou. “Temos que correr atrás dos nossos sonhos e utilizar o medo como incentivo para buscar o que queremos. Para mim, a conexão com a natureza proporciona o contato comigo mesma, com quem eu sou. Essa experiência mudou a minha vida para sempre.”

Ficou curiosa(o) para acompanhar a aventura completa de Julieta? No seu perfil do Instagram, ela compartilhou a experiência em detalhes.

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Isabelle de Paula

Isabelle de Paula é jornalista, sócia-fundadora da DePaula Comunicação. Apaixonada por ouvir e contar histórias, atua como ghostwriter, escrevendo livros e conteúdos para diversas plataformas, e assessora de imprensa, propagando narrativas e trajetórias de pessoas, marcas e empresas. Parceira do Gear Tips, assina projetos especiais e ajuda a empresa a ganhar visibilidade na mídia.

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