Café de Altitude

O montanhista é alguém especial. Quando se propõe a subir uma montanha, fazer uma travessia ou um trekking longo, ele começa uma longa preparação. Por muito tempo, ele estudará o local, o percurso e os atrativos em livros e sites como este em que estamos. Os seus equipamentos serão checados mais de uma vez e nada poderá faltar na mochila, inclusive o café. Até mesmo a preparação física poderá ser alterada dependendo da atividade principal que realizará. Viver na montanha é gratificante, mas exige preparação e cuidados – tantos quanto os que são necessários para cultivo do café especial de altitude. Como acontece no meu quintal: os produtores de café da Serra do Caparaó se empenham em todas as etapas da cadeia produtiva para extraírem da montanha um grão de excelência. Do plantio à colheita, passando pela adubação e chegando à secagem do café, toda a preparação é meticulosa e cada variação desperta os sabores e aromas peculiares dos cafés da região.

Lavouras de café - foto: André Berlinck
Lavouras de café. Foto: André Berlinck

Essa preparação do café de altitude começa com a escolha do grão e o estudo do local de plantio. Na minha vizinhança, o clima predominante é o tropical de altitude, apresentando verão chuvoso e inverno frio e seco. Somado o clima à altitude, o Caparaó é ideal para o cultivo do café da espécie Arábica – o café robusta (conilon) é o mais comum na mesa dos brasileiros, mas o grão cultivado no Caparaó é mais complexo em termos de sabor e aroma. As temperaturas amenas permitem que o amadurecimento dos frutos aconteça mais tarde, permitindo que a planta acumule mais açúcares. É isso que permite a maior expressão de aromas e sabores do café especial, além de trazer uma acidez marcante e agradável, em equilíbrio com o corpo do café.

Lavouras de café - foto: André Berlinck
Lavouras de café. Foto: André Berlinck

A colheita do café

O local onde os pés de café serão cultivados também é importante. O que torna o Caparaó uma região singular em termos de produção de café é seu relevo. As lavouras do Sítio Santa Rita estão entre 1000 a 1500 metros de altitude, entre as mais altas do país. Nessas condições, a colheita do café só se desenvolve manualmente, não sendo possível mecanização como ocorre em outras regiões brasileiras.

Sobre a importância da altitude para o tempo da colheita e a qualidade do café, conversei com o professor João Batista Pavesi, especialista em cafés especiais do Instituto Federal do Espírito Santo – Campus de Alegre “(IFES). Ele me disse que “a planta do café precisa de um conforto térmico para um bom desenvolvimento, não deixando que a maturação aconteça antes da hora. Quanto mais calor, mais rápida é a maturação” – isso é tudo que não queremos: nós esperamos que mais açúcares e mais sabor sejam reunidos no café. O professor Pavesi me disse ainda que “acima de 1000 metros, o café amadurece plenamente e, com isso ,a complexidade dos compostos que são precursores de sabor e aroma é muito maior. Por isso o “café montanhista do Caparaó” se destaca, segundo o professor. “Uma vez que a flor se abriu e ela está fecundada, ela vai gerar um fruto pequeno. Até que esse fruto granar e amadurecer, meses se passam. Para se possa produzir um bom café, é esperado
que o fruto permaneça na planta durante 270 dias, desde a abertura da flor até a colheita. Isso não é possível em regiões mais baixas e mais quentes, regiões não montanhosas”.

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E a altitude ainda trás mais benefícios para o café. O professor Pavesi comentou ainda que estudos desenvolvidos pelo IFES, a Caparaó Jr. e a Universidade Federal de Lavras (UFLA) mostraram que nas regiões mais frias de montanha existe uma microbiota favorável. Ou seja, existiria apenas nesses locais mais altos um conjunto de microrganismos ligados ao café. Essas leveduras estão ligadas à fermentação positiva do café, impedindo o desenvolvimento de outros microorganismos que possam provocar perda da qualidade.

Colheita do café - Sítio Santa Rita- foto: André Berlinck
Colheita do Café – Sítio Santa Rita. Foto: André Berlinck

Pós-colheita

Muito semelhante ao vinho, o café também possui características individuais que são provenientes não apenas do “terroir” (características de umidade, clima, insolação e do solo do local do plantio que influenciam no resultado do café), mas também do processo de pós-colheita. Para cada processo, há um resultado esperado pelo produtor.

No processo natural, talvez o mais comum no Brasil, os grãos são colhidos de forma seletiva, escolhendo um a um apenas os grãos maduros. Depois de selecionadas, as frutas são levadas para o terreiro e secadas com a casca, como saíram do pé, ou seja, de forma natural. Outra forma de processar o café é chamada “descascado”. Aqui, os grãos passam pelo descascador de café antes da secagem. Eles vão para o terreiro apenas com a polpa do grão
envolta numa película muito fina chamada pergaminho.

Por fim, vale comentar sobre um processo pouco utilizado e mais tecnológico, mas que é o responsável por tornar os grãos do café ainda mais doces e ácidos. No chamado processo natural fermentado, os grãos maduros colhidos de forma seletiva, são colocados em tanques para fermentação aeróbica. O café é monitorado por sensores ligados a um software que coletam dados formando o que chamamos de curva de fermentação. Quando o café chega no ponto desejado pelo produtor, ele é avisado de que está na hora de colocar o grão para secar.

Terreiro de secagem do café - Sítio Santa Rita - foto: André Berlinck
Terreiro de secagem do café – Sítio Santa Rita. Foto: André Berlinck

Montanhistas e o Café Montanhista

Definir qual cume conquistar ou o local da colheita, preparar os equipamentos ou as ferramentas para o trabalho, separar a comida liofilizada ou preparar a marmita, acordar ao amanhecer ou antes do amanhecer, tomar um café reforçado ou apenas um café preto não importa: o dia será de conquistas para todos na montanha.

Colhedores em pausa para o café - foto: André Berlinck
Colhedores em sua pausa para o café. Foto: André Berlinck

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Fred Ayres

Fred Ayres é natural de Alegre (ES). Em 2013, passou a lidar profissionalmente com o café em uma fazenda a 7km da portaria capixaba do Parque Nacional do Caparaó. Além de mestre de torra e barista, Fred também é condutor do Parque, montanhista e pai da Cora e do Caetano. Em 2020, ele criou o selo “Outdoor Coffee” para reunir as suas paixões.

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